A ÚLTIMA FLOR
Ilustração: Luísa Reis/Secom UnB

 

Texto: Vanessa Tavares

 

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"A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho." O que está previsto no artigo 205 da Constituição Federal de 1988, já era base do pensamento e do trabalho de Paulo Freire no campo da educação.

 

Referência internacional por seu método pedagógico, o educador teve suas primeiras experiências realizadas de 1957 a 64, no Movimento Cultural Popular – constituído em 1960, em Recife, por estudantes universitários, artistas e intelectuais, sendo voltado à alfabetização de adultos e à educação de base – e na cidade de Angicos, no sertão do Rio Grande do Norte. Em suas práticas, a alfabetização extrapolava a perspectiva de transmissão do conhecimento do educador ao aprendiz, e incentivava a reflexão e consciência crítica sobre o mundo.

 

Mas o que se entende por alfabetizar? É diferente de letrar? Genericamente o conceito de alfabetização é entendido como o processo de aprendizagem em que o indivíduo desenvolve a capacidade de ler e escrever, ou seja, decodificar letras, sílabas e palavras e reproduzir este código.

 

No entanto, não é o suficiente para conquista de uma cidadania plena, para isso é necessário que este sujeito alcance o letramento. Este termo passou a ser utilizado pelos especialistas no Brasil ao lado da alfabetização, na mesma década da promulgação da Constituição Cidadã, e ele refere-se à capacidade de utilização da língua na leitura e na produção de texto de forma adequada e competente para compreender e agir na sociedade em variados contextos.

 

O termo letramento é complexo e abrangente. Atualmente, fala-se em letramentos e multiletramento, visto que considera uma ampla variedade de significados e convenções referentes às diversas esferas da vida em sociedade, como a cultural e a social. Nestas estão inseridas as múltiplas modalidades comunicativas que resultam das características inerentes aos novos meios de comunicação e informação, os quais tendem a continuar se expandindo e renovando.

 

Resumidamente, as diferenças entre letramento e alfabetização estariam relacionadas à qualidade do domínio sobre o texto escrito, à frequência da leitura e da escrita no cotidiano, à competência para lidar com as demandas sociais e para interpretar o mundo.

 

Alfabetização e letramento são dois processos distintos, contudo não necessariamente dicotômicos. Na verdade, eles podem ser entendidos como indissociáveis e interdependentes. É justamente o que se vê no conceito de alfabetização de Freire, no qual está implícito o conceito de letramento, pois entende a alfabetização como um "ato político e um ato de conhecimento, por isto mesmo um ato criador", em que o aprendiz é sujeito, e não o objeto do processo.

 

O ato de alfabetizar(se) é um processo dialógico que ultrapassa a imposição de signos, é necessária a relação destes elementos com o universo vocabular do aprendiz. Para Freire, a leitura do mundo é anterior à leitura da palavra, de modo que a leitura desta implica a compreensão da realidade a partir das experiências individuais. Assim, apreender o texto exige a interpretação das relações entre este e o contexto em que ele se insere, e é neste princípio que se embasam as três etapas que compõem seu método.

 

Na visão de Freire, a leitura e a escrita são práticas culturais e devem ser entendidas em interação com outros e dentro de uma cultura. E sendo a cultura criação humana, os sujeitos podem mudar e promover mudança por meio do seu aprendizado.

 

Método Paulo Freire

Etapa de investigação: busca conjunta entre professor e aluno das palavras e temas mais significativos da vida do aluno, dentro de seu universo vocabular e da comunidade onde ele vive.

Etapa de tematização: momento da tomada de consciência do mundo, através da análise dos significados sociais dos temas e palavras.

Etapa de problematização: momento em que o professor desafia e inspira o aluno a superar a visão mágica e acrítica do mundo, para uma postura conscientizada.