DIÁLOGOS

A pesquisadora Suélia Fleury resgata a importância de universidades e centros de pesquisa para a saúde pública

 

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Ilustração: Marcelo Jatobá/Secom UnB

 

Texto: Suélia Fleury, professora da Faculdade UnB Gama (FGA/UnB) e coordenadora do projeto de pesquisa do respirador Vesta.

 

As universidades e os centros de pesquisas públicos brasileiros, desde a inauguração do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), na década de 1950, tornaram-se ambientes propícios para Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I), principalmente pelo aumento exponencial de Programas de Pós-Graduação (PPG) em todas as áreas do conhecimento. Para que o PD&I das universidades e dos centros de pesquisa públicos contribuam de forma mais efetiva com o setor de Saúde Pública, é necessária a integração da iniciativa privada nos fluxos da pesquisa acadêmica visando à emancipação científica.

 

No Brasil, o Complexo Econômico e Industrial da Saúde (Ceis) é caracterizado pela rede que sustenta o setor da saúde, por meio das atividades e ações de prevenção, promoção, tratamento e reabilitação. Os desafios para a manutenção deste complexo são expressivos e conformam o cenário brasileiro como único em relação ao mercado internacional – devido à extensão territorial do país, que conta com um sistema de saúde universal, o Sistema Único Saúde (SUS)¹.

 

Não obstante, as políticas públicas brasileiras oriundas dos governos (municipal, estadual e federal) dirigidas à Saúde Pública, em muitos casos, dependem do ecossistema de produção comercial e industrial, além das universidades e dos centros de pesquisas públicos – que historicamente assumiram boa parte do desenvolvimento científico e tecnológico.

 

A integração entre estas instituições de pesquisa, o setor privado e a sociedade civil é uma medida crucial para elevar os índices econômicos e sociais. Vale ressaltar que o PD&I em saúde vinculado às práticas científicas interdisciplinares auxilia na manutenção e no desenvolvimento do Sistema Único de Saúde (SUS), base da Saúde Pública nacional, fornecendo soluções tecnológicas capazes de atender a necessidades na área.

 

Desde março de 2020, o mundo ficou alarmado com os impactos da pandemia de covid-19. Só no Brasil, no dia 25 de março de 2021, foram registradas 2.777 mil vidas perdidas, ultrapassando a marca total de 300 mil óbitos causados pelo vírus Sars-Cov-2.

 

As universidades e os centros públicos de pesquisa do país não se furtaram à sua responsabilidade e imediatamente ao início da pandemia começaram a produzir PD&I em saúde para subsidiar o enfrentamento da emergência sanitária.

 

Pesquisadores interdisciplinares da UnB publicaram em janeiro de 2021, na revista Health Research Policy and Systems, estudo intitulado Direct from the COVID-19 crisis: research and innovation sparks in Brazil, que aponta a importância da articulação da rede de PD&I em saúde brasileira para o enfrentamento do avanço da covid-19.

 

Segundo o estudo, entre março e maio de 2020, foram submetidas 894 iniciativas na temática: 551 projetos de PD&I, localizados nos sítios eletrônicos das 114 universidades e centros de pesquisa públicos nacionais; 270 protocolos de pesquisa aprovados pelo Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep); e 73 projetos divulgados pelo Ministério da Educação.

 

A UnB, instituição de vanguarda em PD&I em saúde no Brasil, tem contribuição relevante no combate da covid-19, a exemplo do projeto de pesquisa do respirador Vesta. Realizado em parceria com a Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), a iniciativa desenvolveu, em menos de um ano, uma máscara de proteção contra doenças infecciosas com tecnologia 100% brasileira. O respirador do tipo PFF2 (ou N95, na nomenclatura estadunidense) dispõe de nanotecnologia de quitosana – molécula derivada da casca de camarão – que tem capacidade de atrair e inativar o vírus da covid-19. O projeto está em fase final de teste clínico no Hospital Regional da Asa Norte (Hran), no Distrito Federal. Por meio do Centro de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da UnB (CDT/UnB), o projeto iniciou o processo de transferência tecnológica e o cadastro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

 

A interação entre PD&I e o setor da Saúde Pública, se intermediada pela iniciativa privada, pode ser mensurada quando seus produtos, medicamentos e procedimentos são incorporados nos sistemas de saúde e ajudam a reduzir o impacto de problemas de saúde, a exemplo da covid-19, caracterizando a emancipação científica para usufruto social.

 

Referência:

1 - FELIPE, Maria Sueli Soares et al. Um olhar sobre o Complexo Econômico Industrial da Saúde e a Pesquisa Translacional. Saúde debate, Rio de Janeiro, v. 43, n. 123, p. 1181-1193, outubro/dezembro de 2019.